Casa Romário Martins e o que restou da Arquitetura Colonial em Curitiba
No texto de hoje falaremos sobre um dos mais antigos e tradicionais patrimônios do Largo da Ordem de Curitiba — a Casa Romário Martins, assim chamada desde 1973. Sua construção, porém, aconteceu muito antes, e aqui falaremos sobre a história de uma das mais antigas edificações da capital paranaense.
Origem
Considerada um dos últimos remanescentes da arquitetura de estilo colonial português em Curitiba, a Casa Romário Martins foi construída provavelmente no século XVIII. Durante o século XIX, um de seus proprietários foi Lourenço de Sá Ribas, que a comprou da Irmandade do Santíssimo Sacramento.
As paredes externas, de pedras, fizeram com que o edifício ficasse conhecido em outras épocas como a “casa das pedras”. Suas divisões internas eram de taipa, o assoalho de tabuado largo e as janelas e portas em arco.
No início do século XX, partes da Casa Romário Martins pertenciam a Fridulpho da Silva Pereira e sua mulher, bem como a João Manoel de Sá Ribas e sua mulher. Ali funcionava o Armazém de Paiva.
O Armazém de Guilherme Etzel
A partir de 6 de março de 1902, o imigrante alemão Guilherme Etzel foi, aos poucos, adquirindo a Casa Romário Martins. Sob sua propriedade, ele abriu no local um Armazém de Secos e Molhados, comércio tradicional em regiões com bastante circulação de pessoas, como era o caso do Largo da Ordem.
Nos anos seguintes, há diversos registros de compra de outros edifícios e lotes por Guilherme Etzel, todos localizados no Largo da Ordem. Exemplo disso é o caso de um sobrado que divide parede com a Casa Romário Martins, na Rua São Francisco (e que até hoje está preservado!). Ele foi também construído por Guilherme Etzel, em 1911, ao que tudo indica para servir ao comércio no andar térreo, e à moradia no segundo andar. Anos mais tarde, esse sobrado ficou conhecido como Casa Piekarz, por ter sido alugado pelo alemão Roque Piekarz, que nele instalou uma hospedaria.
Todos esses exemplos mostram que Guilherme Etzel foi um imigrante com posses, fato que o possibilitou investir em imóveis e negócios naquela que era a região mais movimentada de Curitiba.
O Armazém do Roque
Registros da escritura mostram que, em 1925, a Casa Romário Martins e o sobrado ao lado foram vendidos pela família Etzel. A nova proprietária foi a viúva Adelaide Kopp.
De 1930 até a década de 1970, a Casa Romário Martins foi alugada para fins comerciais, abrigando o Armazém Roque, um açougue e uma peixaria no anexo construído ao lado. Esses diversos usos do imóvel transformaram-no por completo: sua estrutura já era muito diferente da original.
Além disso, os demais edifícios antigos do Largo da Ordem se encontravam deteriorados, já que não havia uma política de preservação. Por isso, nas fotos abaixo, vemos que a casa não estava em bom estado de conservação.
O ressurgimento da Casa Romário Martins
Até então, a Casa Romário Martins não tinha esse nome e nem mesmo era um patrimônio público tombado e preservado. Ela somente ressurgiu dessa forma quando houve a transformação de um dos espaços mais conhecidos de Curitiba: o Largo da Ordem.
No início da década de 1970, o IPPUC elaborou um Plano de Revitalização do Setor Histórico de Curitiba, que tinha como objetivo dar uma nova cara e utilidade aos espaços públicos do centro de Curitiba.
Uma das principais medidas desse Plano foi a transferência da feirinha de artesanato que acontecia na Praça Zacarias para o Largo da Ordem, que acarretou na modificação de vários dos espaços do Largo.
Em 1970, o imóvel que viria a ser a Casa Romário Martins foi desapropriado pela prefeitura e passou por um processo de restauro elaborado pelo arquiteto Cyro Corrêa Lyra, que durou até 1973.
Nesse processo constatou-se que — pela idade mais que centenária do prédio e pelas diversas utilidades que teve ao longo do tempo — sua fachada e o interior foram descaracterizados.
O restauro executado, no entanto, conseguiu recuperar boa parte do aspecto externo da Casa Romário Martins. Por sua vez, não foram refeitas as divisórias originais dos cômodos, justamente para que o espaço interno ficasse amplo e pudesse, assim, receber atrações culturais, como as exposições, que até hoje acontecem no seu interior.
Após 3 anos de restauro, em 1973 a casa colonial do Largo da Ordem foi reinaugurada com o nome Romário Martins, para homenagear este que foi um importante personagem paranaense. Inicialmente, ela abrigou o Arquivo Histórico Municipal — semelhante à atual Casa da Memória —, mas desde 1981 é um espaço de exposições relacionadas à memória da história de Curitiba.
Quem foi Romário Martins?
Alfredo Romário Martins (1874-1948) foi um historiador, jornalista e político curitibano.
Desde muito jovem (15 anos), começou a trabalhar em jornais e, promovido a redator, tomou gosto pela História.
O Museu Paranaense esteve sob sua direção por mais de 20 anos. Na política, Alfredo Romário Martins foi vereador e, como deputado estadual (reeleito 9 vezes), criou os brasões do Estado do Paraná e do município de Curitiba, a bandeira do Paraná, regulou o corte de madeira e estabeleceu a data de 29 de março de 1693 como a data oficial da fundação da capital paranaense.
Antes de completar 18 anos, casou-se com Benedita Menezes Alves, sobrinha do poeta Emílio de Menezes. No mesmo ano, estreou como escritor com a obra “O Combate de Cormorant”, sobre o bombardeamento do navio inglês no Forte da Ilha do Mel, ocorrido em 1850.
Um ano depois, publicou a primeira obra oficial sobre a “História do Paraná”, seguida de vários outros livros, sendo os mais relevantes para a História: “O Que é o Paraná” e “Terra e Gente do Paraná”. Em 1900 criou o Instituto Histórico e Geográfico Paranaense.
Defendeu o Paraná nas questões do Contestado quando, em 1901, Santa Catarina ingressou com uma ação reivindicatória relativa aos limites territoriais do Paraná. Foi um intenso ativista em prol da causa paranaense e, ainda no início do século XX, esteve entre os intelectuais que idealizaram o Movimento Paranista, sobre o qual já escrevemos.
Arquitetura Colonial
Entre o fim do século XIX e início do século XX — com a proclamação da República — a cidade de Curitiba buscou se urbanizar e se modernizar. Foi então que muitos edifícios de estilo colonial, muitos dos quais com mais de 100 anos, foram reformados ou mesmo demolidos para dar lugar a prédios de estilos mais modernos.
Por isso, a preservação da Casa Romário Martins ganha ainda mais importância, por representar um dos últimos remanescentes da arquitetura colonial na capital paranaense, juntamente com sua vizinha, a Igreja da Ordem.
Texto e pesquisa de Gabriel Brum Perin
Fontes de pesquisa:
Escritura da Casa Romário Martins: https://pergamum.curitiba.pr.gov.br/vinculos/000071/0000718c.pdf
INSTITUTO DE PESQUISA E PLANEJAMENTO URBANO DE CURITIBA.
Plano de revitalização do setor histórico de Curitiba. Curitiba, PR, 1970, ago. 62 p. Disponível em: https://pergamum.curitiba.pr.gov.br/pergamumweb/vinculos/000042/00004212.pdf
VIEIRA, Flavia Gonzaga Lopes. Espaços Públicos de Lazer no Centro de Curitiba: a transformação da cidade urbana para cidade humana. Dissertação apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Educação Física, no Departamento de Educação Física, Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2010. 103 f. Disponível em:
https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/24064/ESPACOS%20PUBLICOS%20DE%20LAZER%20NO%20CENTRO%20DE%20CURITIBA%20A%20TRANSFORMACAO%20DA%20CIDADE%20URBANA%20PARA%20CIDADE%20HUMA.pdf?sequence=1&isAllowed=y
https://www.fotografandocuritiba.com.br/2017/01/casa-romario-martins.html