Louvre: o Rei da Seda curitibano
A loja de tecidos “Louvre Curitybano” foi inaugurada em 1909 por Bertholdo Hauer. Para tal, Hauer adquiriu a seção de fazendas da loja Paulo Hauer & Cia., da qual ele já era gerente. A loja pertencia a seus irmãos Paulo e José, e funcionava desde 1888 no Palacete Franco - prédio que ficava na Praça Tiradentes, esquina com a Rua Monsenhor Celso e que foi demolido. Bertholdo Hauer deixou a seção de tecidos e armarinhos independente da loja de seus irmãos, fundando, assim, o “Louvre Curitybano”. Hoje, no local, há uma loja de varejo.
O Louvre continuou funcionando no térreo do Palacete Franco até por volta de 1912, quando teve sua sede transferida para a Rua XV de Novembro, em prédio existente até hoje, no número 225.
A primeira seria o fato de a edificação estar alinhada com os modos modernos de pensar as construções na cidade no início do século XX, modos esses que buscavam romper com as práticas coloniais e dar uma nova cara à cidade. Em vários documentos do IPPUC o prédio do Louvre foi descrito como um exemplo da arquitetura eclética de influência Art Nouveau. A arquitetura eclética, adotada a partir de Paris e tida como ideal para expressar o poder da nova elite, foi a escolhida para constituir a paisagem urbana nos processos de modernização de cidades como o Rio de Janeiro na virada do século.
A segunda questão simbólica é que ele foi construído à semelhança e sob a inspiração de lojas de departamento de cidades como Paris e países como Inglaterra e Estados Unidos na segunda metade do século XIX. Essas lojas se tornaram modelos que foram seguidos por outros estabelecimentos em diversas partes do mundo. Algumas das características dessas lojas que se popularizaram são: fachadas modernizadas, configurações interiores e variedade de produtos.
As fachadas monumentais eram outra característica que, dentro de suas possibilidades, o Louvre de Curitiba buscou adotar. Muitas das lojas nos países citados encontravam-se em terrenos muito maiores e de esquina. Já a fachada do Louvre tinha cerca de 13 metros e era um terreno de meio de quadra.
A busca por essa “monumentalidade” pode ser observada também no próprio nome da loja - “Louvre”, palavra francesa que significa lugar fortificado e foi o nome da sede do poder na França até o reinado de Luís XIV.
Tendo em vista todo esse luxo e capital simbólico do Louvre Curitibano, em 1930 o imigrante sírio Miguel Calluf decide comprá-lo. O Louvre continua em funcionamento e sob a gerência de Hauer até que em 1935 ele é reinaugurado sob a direção de Miguel Calluf e seu sócio, e também imigrante sírio, Leão Sallum. Antes de se estabelecer como empresário e adquirir vários estabelecimentos, Miguel Calluf trabalhou por anos como mascate vendendo tecidos de porta em porta no centro e nas redondezas, depois de chegar em Curitiba em 1916 aos 25 anos de idade.
O sucesso com o Louvre e com outros estabelecimentos dos quais foi sócio, como a Casa dos Três Irmãos e a Casa Íris, permitiram que Calluf construísse um grande patrimônio simbólico e material. Exemplo disso é o Edifício Miguel Calluf, construído por ele em 1954 e que abrigava o Louvre Hotel. Posteriormente, o edifício mudou de proprietários e tanto o hotel como o prédio ficaram conhecidos pelo nome de “Eduardo VII”.
O edifício tem o status de Unidade de Interesse e Preservação. Sua localização é ao final da Avenida Marechal Floriano Peixoto, em encontro com o início da Rua Cândido Lopes, em frente à Praça Tiradentes. Em 2020, foi veiculada a notícia de que o grupo VR investimentos, atual proprietário do prédio, iria revitalizá-lo e transformá-la num espaço voltado à locação por temporada. Atualmente, ele está em reformas.
Embora tenha mantido o mesmo nome e sede, a loja é totalmente repaginada e ganha novo aspecto. Para a nova inauguração, o mobiliário foi renovado, um Salão de Mate foi aberto junto à loja e a seda ganhou o status de principal produto dos anúncios, fazendo com que o estabelecimento ganhasse o slogan de “Rei da Seda” e “Palácio das Sedas”.
Nos próprios anúncios é possível notar referências à origem dos novos donos do Louvre, que citam elementos tradicionais da cultura árabe como a seda e as narrativas das “Mil e uma noites”.
Sob a administração de Miguel Calluf, a loja cresceu mais ainda ano após ano. Foi instituída a tradição de, nos meses de novembro, acontecer uma grande venda especial em alusão ao aniversário da loja, com descontos e brindes aos consumidores - que eram em sua maioria mulheres. Essa iniciativa provocava a reação das lojas concorrentes, que se mexiam para fazer promoções no mesmo período.
O aniversário, inclusive, era contado não a partir de 1909 mas sim a partir de 1935, o que reforça o simbolismo da reinauguração da loja com os novos proprietários.
A loja continuou em funcionamento e fez sua fama nas décadas seguintes. Em 1962, Miguel Calluf faleceu e a loja passou a ser propriedade de sua família. Em 1983, foi vendida para o grupo de lojas “Marisa”, que ali se instalou e permanece até hoje. Devido à sua importância cultural, arquitetônica e histórica, o edifício é uma Unidade de Interesse e Preservação (UIP).
Texto e pesquisa de Gabriel Brum Perin
Fontes de pesquisa:
TESSARI, Valéria Faria dos Santos Tessari. “Louvre, o Rei das Sedas: Consumo de moda e sociabilidades femininas em Curitiba - PR (1935-1945)”. Tese apresentada ao curso de Pós- Graduação em Design, Setor de Artes, Comunicação e Design, Universidade Federal do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Doutora em Design. Curitiba, 2019. 347 p.
https://www.fotografandocuritiba.com.br/2017/05/o-antigo-louvre.html
http://www.circulandoporcuritiba.com.br/2019/08/edificio-miguel-calluf.html
Diário da Tarde, 20 de dez. de 1909. Disponível em:
https://memoria.bn.br/DocReader/docreader.aspx?bib=800074&pasta=ano%20190&pesq=bertoldo%20hauer&pagfis=12258