Palácio Avenida, o símbolo do natal curitibano
Inaugurado em 1929, o Palácio Avenida é um dos prédios mais famosos de Curitiba, sobretudo por ser sede da apresentação de Natal, com crianças cantoras enchendo suas janelas com música e arte, e que movimenta a cidade há 30 anos. Construído a pedido do imigrante sírio Feres Merhy, o Palácio Avenida assim é chamado por conta da Avenida Luiz Xavier, a menor avenida da cidade (ela tem 145 metros). O palácio fica na esquina da Avenida Luiz Xavier com a Travessa Oliveira Bello. Na época, os apartamentos e salas comerciais do Palácio Avenida eram disputados por conta de sua localização privilegiada. Além disso, destacava-se também o Theatro Avenida, um dos maiores espaços culturais de então e que ocupava boa parte do edifício.
Origens
“A MAIS BELLA E LUXUOSA CASA DE DIVERSÕES DE NOSSO ESTADO”. Assim era descrito o Theatro Avenida nos dias de sua inauguração, pelo jornal O Dia. O Theatro Avenida foi arrendado pela Empresa J. Muzzilo e Filhos e era um dos empreendimentos que funcionavam no Palacete Avenida, na parte do anfiteatro, de propriedade do imigrante sírio-libanês Feres Merhy.
Feres Merhy (1879-1946) chegou ao Brasil em 1895. Em 16 de abril de 1904 casou-se com Angelina Mocellin, filha de Marco Mocellin. A família Mocellin, diga-se, era do bairro de Santa Felicidade. Em 1907 foi capitão da 15ª Brigada de Infantaria da Guarda Nacional. Foi também membro da Sociedade Syria Paranaense e estabeleceu-se como um grande comerciante, não apenas de Curitiba mas da região Sul de modo geral.
Estabelecido com uma casa de atacados nesta cidade o sr. Feres Mehry estende os seus negócios por todo o sul do paiz, pois possuidor de um stock considerável de fazendas e armarinhos este sr. vende para quasi todos os commerciantes do Paraná e Santa Catharina e mesmo aos do Rio Grande do Sul, pesando de um modo notavel na balança do commercio paranaense.
(A Republica, 9 de set. de 1920, p. 3)
Seu interesse em construir o prédio que viria a ser o Palácio Avenida na Avenida Luiz Xavier datava de mais de uma década antes da inauguração do edifício. Trechos de jornal de 1915 mostram que Mehry buscava autorização junto à prefeitura para a construção de um prédio na Avenida Luiz Xavier.
Para isso, Mehry teria adquirido a "Schlacht Wurstgeschaft Krause", Salsicharia Krause, do imigrante alemão Willian Guilherme Krause, ponto de encontro dos curitibanos para compra de linguiças, salsichas e outros embutidos de origem alemã. Entre eles, a "Wiener", cuja palavra significa "vienense" ou "o que é de Viena", cuja pronúncia alterada pelas diversas línguas dos imigrantes de Curitiba, à época, suscitou a palavra "vina", amplamente usada até hoje no Paraná e Santa Catarina. Mehry demoliu a Salsicharia para o início da construção de seu empreendimento.
"Schlacht Wurstgeschaft Krause", Salsicharia Krause. Foto: Família Krause/Carlos Roberto Krause. Foto de 20 de jan. de 1894.
A firma Bortolo Bergonse e Cia foi encarregada da construção que teve início em 1927. Valentim Freitas fez o projeto da fachada, Bernardino d’Assumpção Oliveira foi o engenheiro responsável e fez o projeto do cineteatro, e o Sr. Amadeu Bipho foi o mestre de obras.
A inauguração do teatro ocorreu no dia 9 de abril de 1929, com o espetáculo Rio-Paris, da companhia Tró-ló-ló e contou com grande pompa e com a presença de grandes autoridades, como o Presidente do Estado do Paraná.
Alguns dias antes, em 29 de março, integrantes do jornal O Dia foram convidados a visitar as instalações do teatro que seria inaugurado, e que assim relataram suas impressões:
Apezar de ainda se achar em trabalho, o Theatro Avenida, já offerece um aspecto imponente. A impressão que se obtém logo a primeira vista, é magnífico, pois, de facto o theatro é excelente. Tudo ali é chic e luxuoso, desde a entrada que é magestosa até a caixa do theatro. (...) Installações modernas por toda parte, toilletes para senhoras e para homens, um magnífico bar, no segundo andar, zona dos camarotes e foyer e uma luxousa bomboniere. (O Dia, 29 de mar. de 1929)
O palácio, no entanto, já estava sendo utilizado antes de 1929. Sua construção começou em 1927 e em 1928 a Inspetoria do Serviço de Povoamento teve sua sede transferida para o prédio, além de outros empreendimentos comerciais que ali funcionavam.
No
theatro aconteciam não apenas peças teatrais mas também a exibição de filmes, o que faria com que, com o tempo, o espaço viesse a ser conhecido como “Cine Avenida”. O Cine Avenida era um dos cinemas que compunha a região conhecida como “cinêlandia” curitibana - espaço da Rua XV próximo à Praça Osório, à Boca Maldita, onde havia uma grande concentração de cinemas.
Outros estabelecimentos famosos situados no Palácio Avenida também foram o escritório do jornal O Estado de São Paulo, a Churrascaria Guairacá e o Café Tiradentes. Estes dois últimos eram ponto de encontro de jornalistas, estudantes universitários, políticos, esportistas e funcionários das empresas localizadas na região - isto é, todos os da chamada boemia curitibana e também da confraria “Boca Maldita”.
Venda
Em 1974, com a Rua XV já fechada para os carros, o Palácio Avenida foi vendido ao extinto Banco Bamerindus, que tinha intenção de derrubá-lo. O projeto somente não foi adiante pois todo o conjunto da Rua XV de Novembro, naquele mesmo ano, foi tombado como patrimônio histórico pela Coordenação de Patrimônio Cultural do Estado do Paraná. Sob o cuidado de Rubens Meister e Elias Lipatin Furman, a fachada do Avenida foi restaurada, e, por isso, quando reaberto em 1991, o edifício manteve parte de suas características originais.
Coral de Natal
Para promover o seu nome e a sua nova sede, em 1991 o Banco Bamerindus passou a patrocinar a apresentação de Natal, que é um coral cantado por crianças e adolescentes durante o mês de dezembro, na fachada e nas janelas do prédio, com luzes, música e decoração especiais.
O famoso espetáculo de Natal no Palácio Avenida chegou até a ser
cenário de novela. Na novela Sonho Meu (1993), o Tio Zé (personagem interpretado por Elias Gleizer) leva as crianças do núcleo infantil da história para assistir ao Natal do Palácio Avenida. Na cena, elas ficam tocadas e emocionadas com o espetáculo.
Mesmo com a falência do Bamerindus, em 1997, e depois com a sua compra pelo HSBC (adquirido, em 2016, pelo Banco Bradesco), as apresentações de Natal continuam no Palácio Avenida, de forma a manter popularizado um patrimônio histórico da cidade.
Atualmente, o Palácio Avenida é a sede regional do Banco do Bradesco e também é uma Unidade de Interesse de Preservação de Curitiba. Na data em que o presente texto está sendo escrito (agosto de 2022), o Palácio está fechado para pinturas em sua fachada.
Texto e pesquisa de Gabriel Brum Perin e Gustavo Pitz
Fontes de pesquisa:
https://prediosdecuritiba.com.br/palacioavenida/
https://www.fotografandocuritiba.com.br/2017/06/palacio-avenida.html
https://www.memoriaurbana.com.br/morar-nas-alturas-edificio/001-palacio-avenida/
https://arquivoarquitetura.com/078
O Dia, 29 de mar. de 1929. Disponível em:
https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=092932&pesq=feres%20merhy&hf=memoria.bn.br&pagfis=14530
O Dia, 29 de abr. de 1929. Disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=092932&Pesq=feres%20merhy&pagfis=14597
A Republica, 2 de abr. de 1929. https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=215554&pesq=feres%20merhy%20&hf=memoria.bn.br&pagfis=38498
A Republica, 19 de abr. de 1904. Disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=215554&pesq=feres%20merhy%20&hf=memoria.bn.br&pagfis=15543
A Republica, 19 de jun. de 1907. Disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=215554&pesq=feres%20merhy%20&hf=memoria.bn.br&pagfis=19518
A Republica, 19 de mar. de 1915. Disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=215554&pesq=feres%20merhy%20&hf=memoria.bn.br&pagfis=29227